Em mim tudo é sede
Em mim tudo é sede
O oceano virou pedra Os rios desapareceram Eu desapareci, se é que um dia existi Envelheci para as minhas sensações Não me alimento mais de poesia Envelheci diante da saudade Essa saudade que constrói moradas para ninguém em mim Tão sozinha caminho eu Com as minhas perturbações Cheia de angústias desmedidas Sem sentir a inquietude da vida Sem sentir o tempo Envelheci para a minha história Sou página amarelada cheia de anotações O ridículo era falar de mim Hoje o ridículo sou eu Não há mais vento ou tempestade no meu céu Não há mais sorrisos ou diferenças no meu eu Tudo tornou-se comum Tudo virou cinzas E a meia onde eu guardava minhas ansiedades tem furinhos O letreiro da loja de veículos anuncia vendas Eu doei meu solo ao homem das plantas Fiz-me serpente para enganar Eva O bem e o mal travam batalhas dentro de mim Fui sua mulher outrora Tornei-me feiticeira de almas Cigana do amor E ser sua mulher nem foi pouco ou muito Foi o infinito do meu ser Castraram minha ingenuidade Você me castrou Levou de mim o furor A sede de ser coragem Não tenho mais nada. Não sou mais nada. A existência dorme num pensar qualquer A aliança está em cima da mesa Cuidado com o cão Vou ser outra nas minhas coisas E as coisas só são coisas porque damos-lhe nomes Senão não seriam nada Iguais a mim que sou o não-ser da minha existência E sonho com Dédalo Mas sou figura trigonométrica Um seno de qualquer coisa E as coisas são coisas e mais nada. Rosângela Trajano
Rosângela Trajano
Enviado por Rosângela Trajano em 12/10/2019
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