Girassóis
Retirei de mim um fogo com brasas de idéias sem nomes. Atrás do relâmpago guardei meus segredos indefesos das guerras Napoleônicas. O prato de comida vazio...a miséria dos meninos africanos era igual a miséria dos meus rastros despidos de vontade. Eu gostava de olhar pés descalços, porque eles contavam histórias de labutas árduas. Eu gostava de olhar à lua. E quando a lua estava minguante eu pensava, comigo, ela está sorrindo para mim. Aí vinha a lua cheia e eu ficava admirando meu rosto cansado e sofrido da indisciplina dos meus sentimentos. E, no dia 18 de junho, desenhavam um sorriso tímido na minha alma. Caminhava para lugar nenhum. Talvez procurasse estrelas... Abri a caixa de fósforos para acender-me. Fui uma formiga diante da multidão barulhenta. Fui uma ave de rapina presa no alçapão do menino do sertão. E ele sorriu...ele sorriu. Adorava as bonecas de pano que vovó me costurava. Adorava as bonecas de porcelanas nas vitrinas alheias. Sentei-me no cais só para dar adeus aos navios que levavam meus sonhos de menina e, de repente, me vi mulher. Fiz barquinhos de papel e me imaginei num cruzeiro de luzes e aplausos. Sempre estive só. Meus barquinhos morreram na praia. Fui noiva de ninguém e rasguei o vestido à porta da igreja. Ao padre confessei meus pecados de menina-moça que anseia o primeiro beijo. Beijei o padre! Tereza, a puta da minha rua, saía todas as noites para vender o corpo e eu ficava me perguntando se ela era feliz. Enquanto Tereza vendia o corpo o homem da esquina vendia pipocas num sorriso sem dentes. O tamanco era pequeno e eu o queria para mim. Mas a porta fechada me negou enxergar o outro lado da vida que nunca me apresentaram. O outro lado da vida eu senti hoje, na velhice, numa tarde onde os girassóis dançaram para mim. Rosângela Trajano
Enviado por Rosângela Trajano em 14/01/2020
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