O menino e o palhaço
Era uma vez um palhaço chamado Faísca. Era dono de um circo pequenino. Com uma lona velhinha e tábuas pregadas umas nas outras para o público sentar. A única atração do circo do palhaço Faísca era ele e um gato preto que miava cumprimentando o público. Só isso fazia a alegria de um menino esperto por demais. Sim, a plateia do circo se resumia num único menino e mais ninguém. As crianças diziam que o circo era ruim, que o palhaço Faísca não sabia fazer palhaçadas, que não tinha mágicos e nem trapezistas. Isso não é um circo! Mas, o menino nunca desistiu de ir ao circo ver o palhaço Faísca. E todos os dias pagava uma moedinha para assistir o espetáculo mais bonito que já tinha visto em toda sua vida. O palhaço Faísca se preparava todo para receber o menino. Ele não sabia por que fazia aquilo. Talvez o menino merecesse. Talvez gostasse daquele menino por demais. Também tinha que ter espetáculo no circo, pois o espetáculo nunca pode parar. Acontece que um dia o palhaço Faísca recebeu uma visita inesperada. Um homem de gravata e sapatos pretos trouxe-lhe uns papéis para fechar o circo, pois não tinha condições de funcionar. A lona estava toda rasgada e a bancada não oferecia segurança ao público. O palhaço Faísca sentou-se numa pedra meio tristonho porque sabia ser verdade tudo aquilo que tinha escrito no papel entregue pelo homem sério. Caso não reformasse o circo num prazo de quinze dias ele seria interditado. Ali mesmo chorou. De repente, o menino apareceu e tomou um susto ao ver o melhor palhaço do mundo chorando. O menino achou estranho. Olhou mais e mais para o palhaço. Levou as mãos à boca como gesto de espanto. O palhaço chorava de verdade. - Por que você está chorando? - Não estou chorando, menino. Foi um cisco que caiu no meu olho. Só isso. - Ah! Tá bom! Porque palhaço nunca chora. Palhaço só sorri. O menino disse aquilo para enganar o palhaço Faísca, pois no fundo sabia que ele chorava de verdade. - Você está soluçando, também? - Não! Não é nada! Vá para casa e volte na hora do espetáculo! O menino obedeceu ao palhaço, mas sabia que algo estava errado. Quando passava diante da entrada do circo viu uma placa e curioso foi ler o que dizia. - I - N - T - E - R - D - I - T - A - D - O! Que palavra difícil. O que quer dizer isso? O menino correu para casa cheio de curiosidade. Assim que abriu a porta da sua casa foi logo perguntando a mamãe quase sem conseguir respirar e pronunciar a palavra de tão cansado que estava - Interditado significa fechado. - Fechado para sempre, mamãe? - Depende! Acho que não! Do que se trata? O menino não quis dizer a mamãe que era o seu circo, porque ela achava aquele circo muito feio e o palhaço sem graça. A mamãe dizia que num circo tem que ter mágicos e trapezistas além de outras atrações. E que o palhaço Faísca só sabia fazer o povo sorrir com as suas palhaçadas. - E isso é pouco? Perguntava o menino, curioso. Para ele fazer alguém sorrir em tempos difícieis onde as pessoas só vivem de cara fechada umas para as outras devia ser muito complicado. O menino voltou correndo para falar com o palhaço Faísca. Insistiu em saber o motivo do seu choro e o palhaço achou que o seu público devia saber do acontecido, mesmo que aquele público fosse apenas um menininho de nada. Então, o menino teve uma brilhante ideia. Ele era bastante criativo. Tinha ideias para tudo. Correu para a rádio local e falou com o locutor. - O que você quer mesmo? - Um anúncio sobre o circo. Diga que aqui tem um palhaço diferente de todos os outros. - O que aquele palhaço feioso tem de diferente, menino? - Você nunca viu! Ninguém viu mesmo! Só eu vi! - E o que o faz diferente dos outros palhaços? - Não posso contar! Você tem que descobrir sozinho! Pode anunciar que sábado terá espetáculo com um palhaço diferente? - Posso, sim! Mas isso não vai trazer ninguém para o circo. O locutor fez um anúncio bem bonito no seu programa da rádio que era transmitido para o mundo inteiro. Como o menino pedira e como ficou curioso para descobrir o que o palhaço Faísca tinha de diferente dos demais palhaços o locutor convidou todas as crianças para assistirem ao espetáculo do próximo sábado. O menino rezou para que viesse muitas crianças ver o espetáculo de Faísca, assim ele conseguiria o dinheiro para reformar o seu circo. Mas como colocar muitas crianças no circo de forma que não se machucassem?, pensou o menino. Assim que o dia amanheceu ele foi falar com o homem de sapatos pretos e pediu autorização para liberar o circo só mais uma vez. - É perigoso! Tem que ter cuidado! As crianças podem cair e se machucarem! - Ninguém vai cair! Eu prometo! - O que vai fazer então? - Todo mundo vai sentar no chão! - Tudo bem! Está liberado para o sábado! Depois interdito até reformarem. - Muito obrigado, senhor! No sábado, conforme o menino pediu a Deus, formou-se uma fila de crianças de frente a bilheteria do circo. Foi o maior público de um espetáculo já visto no mundo inteiro. Eram crianças de todos os lugares do mundo. Elas queriam saber o que aquele palhaço tinha de diferente dos demais palhaços. Faísca ficou assustado ao ver tantas crianças. E quando soube do anúncio do locutor ficou preocupado, pois não se achava diferente dos outros palhaços. A única diferença é que era pobre e não tinha dinheiro sequer para comprar roupas novas e se apresentava há mais de vinte anos com a mesma roupa. Foi falar com o menino. - Por que inventou que sou um palhaço diferente? - Você não se acha diferente dos outros palhaços? - Não! Todos os palhaços são iguais e fazem a mesma coisa. Brincam e fazem as crianças sorrirem. - Eu acho que você é diferente. E as demais crianças também vão achar. O espetáculo começou bem na hora informada. O palhaço Faísca estava apreensivo e nervoso. Não sabia nem o que fazer para alegrar a criançada. Dentro de si veio uma vozinha que dizia - Faça-as sorrirem! Só isso! E assim começou o seu espetáculo brincando com as centenas de crianças. No final, foi bastante aplaudio. As crianças gritavam para ele, acenavam, aplaudiam contentes. Emocionado começou a chorar e chorou muito. De forma que as crianças bateram mais palmas para ele. E percebeu que a diferença dele para os demais palhaços é que sabia chorar, também, porque dizem às crianças que palhaços não choram. - Viu como eu disse que você era diferente? - Na verdade a minha vida inteira eu fui um chorão. Aprendi a sorrir para alegrar as crianças. Mas todas as noites choro de tristeza por ver o mundo tão doente. O menino e o palhaço Faísca se abraçaram e choraram bem muito de alegria. Acredito que no mundo não existe nenhum palhaço chorão igual a Faísca. Rosângela Trajano
Enviado por Rosângela Trajano em 20/08/2020
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