Rosângela Trajano

Nasce uma estrela sempre que se escreve uma poesia

Textos


Perdi o meu amor

Ao meu amor, com carinho. Amor que nunca esquecerei.

Perdi o meu amor quão relâmpago que passa rapidamente
Fim inesperado na minha vida operária de ilusões.

Eu perdi os crepúsculos das tardes de inverno
As folhas trazidas pelo vento de outono
As flores coloridas da primavera que nunca observei
Os dias quentes de verão sempre a reclamar do calor.

Perdi o cheiro da natureza viva
Em quadros de natureza morta vislumbrei
Perdi muito e com isso esqueci a beleza das coisas ao meu redor.

Como nunca tive o sentimento de posse
Custei a acreditar que aquele amor fosse meu
Aos poucos fui me acostumando com ele no meu coração
De pequeno tornou-se um gigante em mim
E meio bizarra fui me apossando daquele sentimento
Que chamo agora de meu, porque para senti-lo em todas as suas vestes trago o choque da sua descoberta grandiosa... e se possuí algo na vida foi o meu amor...não me julguem se faço-os pensar em egoísmo, pois no fundo penso ser dona de um amor único no mundo, morador em mim, correndo nas minhas veias atrás das luzes minhas.

Perdi o meu amor para os astros não sei se do dia ou da noite.

Escrever para mim é mais doloroso ainda do que a sua perda, pois enquanto escrevo as lembranças me chegam rasgando meus sentidos, desbravando emoções muitas.

Eu que não sabia o que era amar
Fazia anos... sim, muitos anos.

As pessoas querem a razão
O método cartesiano de Descartes
Os juízos a priori de Kant
Eu quis a fenomenologia de Foucault
Ser consciente de alguma coisa ao menos
Ou quem sabe ter a intenção de ser
Esqueci do seu ensinamento sobre o cuidado de si
Entreguei-me ao descuido... meu amor foi descuidado
Assim agi sem saber a noção do que fazia
Acreditando está certa... pura imaginação
Loucura rápida que se apodera da alma
E nos rouba a sensatez, a paciência, a tolerância
Desobedecendo o sinal vermelho da avenida das minhas virtudes
Surdez minha apedrejada em praça pública pela ironia de mim.

Estou com o meu pássaro
Sem a sombra do meu cajueiro
Olho o pôr do sol e penso no amanhã.

Tinha esquecido como era amar
Ontem chorei tanto que ardem meus olhos
Quis voltar... mas olhei o relógio e era tarde
Demasiadamente tarde o meu retorno.

Ah! Tempo, tempo, tempo...quem me dera
Poder está no ontem e desenhá-lo de outra forma
Com sol, sorrisos, cores, pincéis, céu azul
E poder falar com Deus nos finais de tardes
Ao lado do meu amor que tem olhos reluzentes
Olhos que acolhem risos perdidos
E nos faz sorrir sorrateiramente... que gostoso! Dei gargalhadas 
Meu amor tem nos olhos o horizonte
E coração de criança que faz peraltices.

A mão que eu segurava ao dormir desapareceu
Estou cortada por dentro em mil pedaços
Deus, Deus, Deus...eu te fiz tantos pedidos
Onde estavas meu Pai que não me ouviste?

Ah! Pássaro meu como quis ter as suas asas ontem à noite
Na hora do arrependimento poder num voo retornar
Aos braços frágeis do meu amor maior.

Choro, choro, choro sim, todas as minhas lágrimas
Já não sei quem sou olhando-me no espelho
Eu que desaprendera amar na escola da vida
Por que permiti repetir a lição em que sempre fui reprovada?
Por quê? Por quê? Por que, meu Deus?

Da janelinha do meu quarto olho a lua
E o último dia ao lado do meu amor está no ontem
Não tenho mais os seus beijos ternos
A leveza das suas mãos ao tocar o meu corpo.

Caí num poço sem água de cabeça para baixo
É um tormento ouvir o adeus de quem se ama
Esquecer o carinhoso e íntimo apelido.

Meu amor agora pertence ao mundo
Sou soldado de volta para casa depois de uma batalha perdida
A nódoa cinza manchou a minha alma.

Perdi o meu amor às dezoito horas de ontem
Faço questão de registrar o exato momento.

Que culpa tenho eu de ser diferente dos outros?

Foge de mim o amor que ontem era meu
E meu pranto molha a roupa seca que esqueci no varal
Preciso reaprender a viver só.

A voz do meu amor me fez falta nesta tarde
Como gostaria de ter ouvido as suas palavras
Repetidas palavras, palavras que embalavam o seu pensar
O meu amor gosta de falar, de ouvir o canto das palavras
Na minha incompreensão muitas vezes quis o silêncio
Mas hoje eu escutaria todas as palavras do meu amor
A noite toda... toda a noite... a noite toda
Que pena! E lembrar que reclamei suas tantas conversas
Deixei meu amor em monólogos distantes de mim.

Meu amor é um pássaro em gaiola de si precisando de zelo.

Eis-me, ó vida, tu que és senhora de mim
Fazes dessa tua escrava o que quiseres.

Rezo a última Ave-Maria do meu terço
Deus, Senhor dos senhores, escutai-me
Preces poderosas viajem aos céus
Rogo pelo meu inefestável amor à porta da igreja fechada.

Preste atenção, meu amor, me ouça, por favor
Acredite que meu mal é não saber viver sem você
Tempestades em mim acusam um sofrer acorrentado em lembranças
Estou só... sozinha no mundo... dentro do meu simulacro
Sorrindo aos parentes curiosos por saber o que sinto
E para você, meu amor, digo sentir um aperto no peito
Ávida por teu amor... arrependida assim estou.
Rosângela Trajano
Enviado por Rosângela Trajano em 28/09/2020
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